O Diabo Mora Nos Detalhes

Existem duas maneiras para se fazer uma infusão. A primeira é aquela que você sabe o que está fazendo, já testou todas as opções do posicionamento das linhas de vácuo e de resina, mediu a pressão no interior da bolsa de vácuo e vai para o campo com a certeza de que tudo vai correr exatamente como você projetou. A outra é na marra. Esta última, às vezes, funciona, mas pode gerar um laminado frágil, com vários locais de impregnação defeituosa, o que a vai acabar gerando problemas estruturais no futuro próximo. Às vezes, a infusão é tão defeituosa que o barco deve ser descartado, porque a recuperação de um trabalho malfeito não vai compensar. 

Uma das ferramentas mais interessantes que eu tenho utilizado é o software de modelação de fluxo (flow model), que determina com precisão suíça o local e o tempo correto que a resina vai entrar no laminado e a quantidade ideal de fibra e resina para cada tipo de barco. Para utilizar o software, é necessário gerar as curvas de permeabilidade de cada parte do barco, o que é feito através de um teste simples colocando resina de um lado de uma placa plana e medindo a velocidade do escoamento. Depois de um certo tempo você acaba tendo um grande banco de dados com uma infinidade de padrões de laminação e ai tudo fica mais fácil.

Outro ponto importante é a quantidade de pressão. Uma coisa é a pressão medida na bomba de vácuo; outra é a pressão real dentro do laminado, e essa diferença pode significar um desastre completo. Sugiro sempre utilizar um medidor de ultrassom para procurar pequenos vazamentos, que juntos acabam inviabilizando qualquer infusão. Se a pressão inicial não for de 720mm/Hg e a queda em 5 minutos for menor que 50mm/Hg, a chance de falha será considerável.

Por fim, não é qualquer resina que seve para infusão. Mesmo entre as resinas de infusão, existe grande variação de viscosidade, molhabilidade e cura. Procure uma resina que tenha comprovado sucesso e mantenha-se nos padrões de catalisação que o fabricante recomenda. 

O pensamento popular (e incorreto) é que uma resina com mais tempo de geltime é melhor porque dá tempo de preencher os espaços da fibra. Mas, ao contrário, ela acaba gerando uma matriz sub-curada que ao invés de ficar rígida vira um plástico maleável, e aí todo mundo já sabe qual vai ser o resultado.

Quanto Mais Resina Melhor (NOT)

Decidi lançar uma campanha com nome que adaptei do cinema. Ela vai se chamar “Quanto mais fibra melhor”.  O plágio veio do filme do final da década de 50 “Some Like It Hot” que foi traduzido para o português como: “Quanto mais Quente Melhor”, onde Tony Curtis e Jack Lemmon são dois músicos desempregados que se metem com um bando de mafiosos, fogem e se disfarçam de mulher a caminho da Florida, onde encontram com a cantora Sugar Kane, no caso Merilyn Monroe.  Daí em diante, só vendo o filme. 

Mas isto não vem ao caso, pelo menos agora. Vamos supor que você seja o gerente de laminação de um estaleiro. O problema é que quando você não tem um parâmetro para dar para seus funcionários para quanto gastar de resina em um determinado laminado então você pode rezar, acender uma vela e colocar um copo d’agua sobre sua mesa. Não que eu acredite em nada disto, mas, tem gente que só pode acreditar, pois não vai mudar em nada

O consumo de resina vai subir assim como o tempo de laminação e o custo do barco. Um laminado de dificuldade média consome 2 kg de resina por m2. Imagina se o seu barco consumir muito mais, devido a falta de meta e do desperdício que a laminação manual tem intrínseca no processo.

Durante os últimos meses fiquei tão envolvido em experiências com laminação de barcos e eu não tenho mais dúvidas que só poucos gerentes, ou mesmo donos de estaleiros, culpam o custo da matéria prima mas não veem o desperdício em sua produção.

O que mais me incomoda é saber: como ninguém pensou nisto antes? Bem, também não é assim. Muito fabricante de barcos nos USA e Europa estão transformando toda a linha de fabricação para sistemas mais “experts” como a laminação por infusão, onde você consegue medir com muito mais clareza o consumo e custo.

Então, por que ainda estamos laminando em um sistema de desperdício? Acho que o problema é cultural. Daqueles “time que está ganhando não se mexe”. Não sei não, mas todos os laminadores que eu tenho treinado, e que foram acostumados com o sistema tradicional, de balde, rolo e aquela #$%^%$ toda, não querem saber de outro tipo de trabalho. 

Segredos da Laminação Secundária 

Pouca gente se atenta ao fato que laminações secundárias aumentam o peso e custo, em larga escala, que poucos conseguem medir. Mas é difícil de explicar para o povo da produção e da qualidade, sem falar do pessoal do custo, que cada 2 centímetros a mais na laminação secundária de reforços do casco, do convés, da casaria e do resto do barco não ajudam ao estaleiro a poupar tempo e dinheiro.

Na laminação do casco 5 cm de ovelap entre as camadas são suficientes para “amarrar” as camadas, mas eu entendo que trabalhando em um casco com metas de produção estabelecidas fica difícil você ficar medindo overlaps. Por isto mesmo este aumento de peso varia entre fabricantes de 5% a 10%. Muito fabricante tem entre 10-20 cm de overlaps entre camadas na colagem de reforços. 

No processo de infusão a vácuo é mais fácil medir os overlaps, ou sobreposições, porque tudo ainda esta seco, mas quando você começa a laminar junto com maquina despejando resina sobre o laminado então os overlaps crescem. E mais ainda, a rugosidade dos laminados aumentam. Colocar fibra de vidro seca com uma máquina molhando em seguida necessita de treinamento. 

Mas o que quer dizer isto??  É simples: Não dá tempo de esticar os tecidos. Então fica muita resina presa entre as tramas, o que aumenta o consumo de resina ao extremo.

Em recente pesquisa em um estaleiro grande, o desperdício de resina decorrente do aumento de sobreposições e enrugamento dos tecidos pode chegar a 22% em peso e custo!