Strip Planking em Espuma de PVC – Parte 1

O método de construção em strip planking em espuma PVC, desenvolvido pelo departamento de engenharia da Barracuda Advanced Composites, tem os mesmos fundamentos do método utilizando madeira, que foi um dos primeiros processos utilizados para construção amadora de barcos a vela e para a construção de modelos e moldes.  Nas próximas semanas os posts do Blog de Manual de Construção de Barcos vão explorar esse método, começando aqui por uma visão geral que elucida todas as vantagens e etapas do processo, e depois abordando a confecção e posicionamento das cavernas e colocação das ripas de espuma.

Esse processo é ideal para construção de embarcações one-off com o mínimo de ferramentas possível e baixo investimento inicial. É mais indicado para barcos com grande parte de superfícies planas, mas é possível produzir superfícies com dupla curvatura. No método tradicional de strip planking, a madeira desempenha toda a função estrutural e as camadas de fibra aplicadas na parte externa do casco têm apenas função de proteção contra umidade. No strip planking em PVC, a espuma tem a mesma função estrutural de um material sandwich, provendo resistência à compressão e ao cisalhamento e garantindo um casco muito mais leve do que se tivesse sua estrutura construída em madeira.

Além disso, barcos construídos com compostos sandwich tendem a não ter qualquer espécie de reforço longitudinal ou transversal, ou pelo menos não tanto quanto os usados em projetos de laminados sólidos e madeira. Barcos projetados e construídos em strip planking de madeira tendem ser dotados de uma série de cavernas transversais (90°) para compensar o uso de ripas longitudinais (0°) utilizadas no casco.

O processo de construção de strip planking em PVC começa com o posicionamento das cavernas, seguido do corte e posicionamento dos strips que são colados um nos outros com uma massa a base de resina poliéster. Depois disso, a superfície externa das espumas é preparada para laminação e acabamento antes do casco ser virado e laminação interna ser iniciada para a consolidação do painel sandwich.

As espumas de PVC utilizadas para construção dos strips possuem densidades que variam entre 60 a 100 kg/m³ para a maioria dos projetos, com espessuras entre 10 e 50 mm, sendo que espessuras até 80 mm podem ser fornecidas caso seja necessário. As ripas de espuma devem ser cortadas com serra circular com uma boa lâmina e dispensam a usinagem de perfis macho e fêmea, como exigido paras as ripas de madeira, já que a colagem lateral é feita de topo, o que acaba reduzindo significativamente o trabalho de montagem.

Inclusive, as ripas de madeira devem ter entre 20 e 25mm de largura e as de espuma podem variar entre 50 e 200mm, a depender do desenho das seções. A largura das ripas deve sempre ser maximizada de forma a diminuir o peso do adesivo, sendo inclusive possível que o construtor use placas com até 1200 mm de largura em barcos a motor com grandes superfícies planas.

As facilidades de montagem e colagem das ripas de PVC fazem com que seja possível diminuir consideravelmente o tempo de construção. Um barco pequeno de 25 pés pode ser montado em oito horas de trabalho, enquanto a construção em madeira levaria semana ou meses. Além disso, com o uso de madeira é obrigatório o uso de resina epoxy para a colagem das ripas e laminação da camada externa de fibras. A espuma PVC permite o uso de resina poliéster para laminação e colagem, o que diminui o custo e permite a construção de um laminado relativamente rígido.

O acabamento é outro aspecto onde o strip planking em PVC leva vantagem sobre o processo que utiliza madeira. Antes da laminação externa das camadas de fibra é necessário que a superfície do casco esteja perfeitamente aparelhada e por melhor que sejam as juntas de madeira, algum ajuste ainda será necessário. E lixar madeira é um processo muito mais trabalhoso do que lixar espuma rígida.

A seleção dos tecidos deve ser feita com base nos planos de construção criados pelo projetista, mantendo sempre as mesmas gramaturas e direções no caso de alguma adaptação. Tecidos biaxiais são sempre a melhor opção para construções one-off e têm a vantagem de permanecerem estáveis ao longo da laminação, diferente de tecidos woven roving, por exemplo, que criam superfícies irregulares. Em barcos muito grandes onde as camadas de fibra ultrapassam 3 kg/m², o construtor pode optar por utilizar um número maior de camadas de tecidos mais finos, que irão fornecer um acabamento quase perfeito.

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Ergonomia e Dimensões Usuais

Projetar e construir um barco é uma tarefa simples quando você usa dimensões consagradas e não tenta inventar nada muito diferente do que se utiliza usualmente. O problema nasce quando o construtor, principiante ou mesmo profissional, precisa projetar sozinho as dimensões básicas de uma passagem, porta, gaiuta, beliche ou mesa. Muitos projetos são extremamente detalhados, mas muitas das dimensões finais necessitam ser ajustadas no protótipo, e os projetistas não tem medo de pedir que o construtor faça este ajuste por ele mesmo. O problema é que nem sempre nesta hora o bom senso fala mais alto e o projeto acaba incorporando soluções que não são usuais na indústria e o produto final acaba mutilado.

Figura 1. Plano de acomodações

Seja qual for o tamanho do barco a dificuldade de encontrar espaços vai sempre existir. Mesmo que o projeto seja muito bom, em algum lugar, vai haver restrição de passagem ou mesmo altura do pé direito. É claro que barcos maiores que 60 pés, têm a vantagem de ter espaço suficiente para a maior parte dos interiores de bordo, mas mesmo assim em algum ponto vai existir uma passagem apertada.

No caso de barcos menores o problema fica bem mais sério. Em embarcações na faixa de 25 a 30 pés, a altura do pé direito sempre é um problema a ser solucionado, e nem sempre o desenho final é aceitável. A dificuldade com este tamanho de barco é que a maior parte dos projetistas quer colocar quase tudo dentro, e convenhamos que em 7-8 metros de comprimento não cabe muita coisa. No caso da altura do pé direito, deve ser dada atenção redobrada na forma final do convés para não ser gerada um desenho que inviabilize a estabilidade final do barco. Em geral, é difícil conseguir um pé direito acima de 1,75 m.

Em barcos abaixo de 40 pés a posição do banheiro e seus acessos também são um problema crônico. Neste comprimento de barco, qualquer espaço tende a ser usado e as passagens e aberturas de portas ficam sempre comprometidas. Parece que hoje em dia todas as cabines de um barco precisam ter privacidade e porta, o que certamente é a causa de muitos espaços difíceis de serem utilizados. Este é o caso clássico dos banheiros de bordo.

Figura 2. Dimensões dos banheiros

Tentar colocar uma pia, um vaso sanitário, um chuveiro e um armário em um espaço menor que 1 m² é sempre um desafio. Isto sem contar que nos locais onde os banheiros são instalados sempre existe restrição de altura.

Outro ponto que o projetista e construtor devem prestar atenção é nas alturas e larguras dos assentos. Isto é preferencialmente crítico em barcos à vela, onde a maior parte do tempo eles navegam adernados. Os assentos do cockpit devem ter a altura correta para evitar que a tripulação escorregue o tempo todo e não tenha nenhum tipo de apoio para os pés. A largura dos assentos e altura dos encostos deve permitir conforto para a tripulação sem ferir os conceitos básicos de estética. No caso de assentos internos de sofás e camas, eles devem contemplar também as alturas livres de pé direito e posição para entrada e saída dos acessos.

Figura 3. Layout dos assentos

No caso de camas e beliches, sempre vai existir um comprimento e largura mínimo que deve ser respeitado. Não adianta querer colocar 6 camas em um barco de 30 pés, pois nunca ninguém se sentirá confortável e o proprietário do barco vai acabar se deparando com tripulantes dormindo sobre os paineiros do fundo do barco.

Figura 4. Dimensão dos beliches

O Uso de Fibras de Aramida

A história da fibra de aramida começa na década de 1960 e sua protagonista é a americana Stephanie Kwolek, bacharel em Química formada em 1946 pela Universidade Carnegie Mellon. Profundamente interessada em ciência desde a infância, Stephanie sonhava em ser médica, mas a falta de fundos ao fim de sua graduação a levou a aceitar um cargo de pesquisadora no laboratório de fibras têxteis na DuPont.

A DuPont estava preocupada com a iminente escassez de energia que seria provocada com a falta de combustíveis fósseis e estava convencida que fibras poliméricas poderiam substituir cintos de aço que eram utilizados na fabricação de pneus radiais, o que reduziria o peso total de veículos e economizaria combustível. Por esse motivo, Kwolek trabalhava na condensação de polímeros baseados em petróleo para o desenvolvimento fibras mais fortes e rígidas.

Normalmente, ela fundia os polímeros que produzia e um colega processava a mistura para transformá-la em fibras finas. Mas quando produziu um polímero que não derretia em 1964, ela se concentrou em encontrar um solvente para dissolvê-lo. Depois de várias tentativas, Kwolek obteve sucesso e conseguiu obter uma substância fluida turva de baixa viscosidade, muito diferente da massa viscosa e clara que os outros polímeros produziam.

Persistência foi necessária para que o material fosse processado, já que seu colega reclamou que a baixa viscosidade do fluido poderia obstruir sua máquina. Eventualmente, o colega foi convencido e a fibra produzida apresentou uma resistência cinco vezes maior que a do aço. A chave para as incríveis características estruturais da fibra de aramida que saiu desse processo são os anéis aromáticos ligados por grupos de amida. Essa fibra é conhecida como Kevlar® e foi introduzida no mercado pela DuPont em 1971.

Além da DuPont, existem hoje várias fábricas produzindo fibras aramidas com nomes registrados como Twaron® e Tecnora®, mas são basicamente o mesmo produto e geralmente possuem a coloração amarela. 

As duas formas principais de fibras aramidas produzidas são: o Kevlar® 29, usado em cabos e coletes à prova de balas, e o Kevlar® 49, utilizado como reforço em plástico reforçado. Nos últimos anos, as fibras aramidas têm se tornado um material muito utilizado na construção de laminados de alto desempenho que exigem alta rigidez e leveza. Comparadas com outros materiais, as fibras aramidas mostram uma resistência específica muito grande, podendo ser maior até que algumas fibras de carbono. São cinco vezes mais resistentes que o aço e duas vezes mais resistentes que o vidro E.  A resistência ao impacto é também um dos pontos altos das fibras de aramida, especialmente pela sua habilidade em resistir a choques cíclicos e capacidade de impedir a propagação de trincas e microfissuras. A resistência à compressão, no entanto, deixa a desejar em relação aos outros tipos de fibra.

Geralmente, se fala que os tecidos de fibras aramidas são difíceis de laminar porque a sua cor não permite ver onde está sendo colocada a resina. A dificuldade de laminar essas fibras vem do fato de que elas não se tornam transparentes como a fibra de vidro quando impregnadas pela resina. Em barcos elas são usadas normalmente em tecidos híbridos com fibras de vidro.

Fração em Peso e Volume de um Laminado

Uma das formas de se identificar as quantidades de fibra e resina dentro de um laminado e conseguir estimar os valores de resistência a tração, compressão, flexão e seus módulos de elasticidade é pelo cálculo de fração de volume e peso em um laminado. A estrutura básica de laminação é constituída por uma fibra de reforço, que pode ser vidro, aramida ou carbono e seus híbridos com uma matriz polimérica, seja ela poliéster, estervinílica ou epoxy.

Cada um destes materiais exibe uma densidade e um limite teórico para ser usado em conjunto, de modo que seja possível utilizar o menor valor possível de resina, mas ainda garantindo a impregnação de todas as fibras. Cada fibra apresenta uma característica diferente de “molhabilidade” em função do seu diâmetro e da compatibilidade com a resina. Quanto menor o diâmetro do filamento, maior a necessidade de usar resinas com melhor propriedade de adesão e maior pressão de vácuo sobre o laminado para que todas as fibras fiquem impregnadas e transmitam melhor os esforços entre si.

A fração em peso geralmente é aquela que o construtor usa para determinar a quantidade de fibra e resina em seu laminado, também conhecida como teor de fibra. Se o peso de cada produto dentro do laminado for conhecido, é possível então identificar a fração em volume da fibra e da resina por meio de formulações simples. A massa total, assim como o volume do laminado, pode ser descrita matematicamente como:

Equação 1

Equação 2

Onde V se refere ao volume, M a massa, o subscrito f a fibra, o m se refere a matriz de resina e o c ao composto inteiro. Dividindo os dois lados das equações por MC e VC, respectivamente, podemos obter as frações mássicas e volumétricas:

Equação 3

Equação 4

As frações mássicas e volumétricas são números que variam entre 0 e 1 que indicam quanto espaço ou massa elas representam no todo do laminado. Sabe-se que as frações mássicas são fáceis de se medir antes da fabricação do laminado com uma balança comum, por isso são muito úteis para calcular a densidade do composto. No entanto, a fração volumétrica é a variável utilizada para prever as propriedades do composto com base na micromecânica, por isso é importante ter uma forma de obter essa informação.

É possível identificar a fração em volume da fibra e da resina por meio da Equação 5, onde os subscritos f e m são intercambiáveis.

Equação 5

Na Figura 1, é possível encontrar a relação descrita pela fórmula anterior em um gráfico que diz respeito a três tipos de fibra muito comuns.

Figura 1 – Fração em volume em função da fração em peso

Como o principal fator na resistência e no módulo de elasticidade está associado à quantidade de fibra e resina dentro do laminado, no geral, quanto mais fibra, mais resistente é o laminado. Entretanto, uma quantidade reduzida demais de resina pode gerar um laminado seco e frágil, com baixa resistência a compressão, e uma quantidade grande demais irá produzir um laminado pesado e não econômico

Com isso, mesmo que o objetivo final fosse produzir um laminado com 100% de teor de fibra, esse número nunca poderia ser atingido, pois por melhor que as fibras fossem acomodadas, alinhadas e compactadas, ainda assim haveria espaços a serem preenchidos com resina. Isto só aconteceria se o laminado fosse unidirecional e todas as fibras fossem hexagonais e todas se tocassem por meio das arestas. Como as fibras têm uma forma quase circular, o agrupamento de três filamentos, por exemplo, iria criar um espaço vazio entre eles, proporcional ao diâmetro do filamento. Assim fibras com um menor diâmetro de filamento tendem a ter uma fração em volume maior e por esse motivo uma resistência maior.

Teste de Permeabilidade

A simulação numérica do processo de infusão é essencial para a fabricação de peças com alta resistência mecânica e eficiência econômica. A confiabilidade da simulação está diretamente ligada à qualidade dos dados de entrada no software, que incluem as características dos materiais e a geometria da peça a ser infundida.

A característica mais importante a ser determinada é a permeabilidade, que nada mais é que a resistência que o meio poroso apresenta à passagem da resina. Matematicamente ela pode ser determinada pela Lei de Darcy da seguinte forma:

 

A permeabilidade (K) depende, portanto, da viscosidade da resina (μ), da porosidade do meio a ser permeado (φ), do gradiente de pressão (ΔP) utilizado e do termo L²/t, ou seja, a posição da frente de resina ao quadrado dividida pelo tempo em que ela leva para chegar a tal posição.

Existem algumas maneiras de determinar a permeabilidade de forma experimental, mas a mais comum é utilizando a estratégia chamada edge injection, onde uma placa retangular é ensaiada e a entrada da resina ocorre em uma aresta enquanto a tomada de vácuo é aplicada na aresta oposta, como indicado na figura a seguir:

É importante deixar um espaço de 50 mm entre o fim do laminado e a saída de vácuo para se evitar a saturação da linha de vácuo. Para uma infusão perfeita, o gradiente de pressão deve estar acima de 0,9 atm e a viscosidade da resina deve variar entre os limites de 150 e 250 cps, independentemente do tipo de resina, seja ela estervinílica, poliéster ou epoxy.  A porosidade corresponde a fração de espaço vazio no meio poroso disponível para a resina ocupar. Cada tipo de reforço, diâmetro dos filamentos e o alinhamento das fibras, proporciona um valor diferente de porosidade.

Já a razão L²/t é o que se busca determinar experimentalmente. Para o ensaio de determinação da permeabilidade, é necessário utilizar o mesmo plano de laminação da peça que se pretende simular e construir. O teste deve ser feito em uma superfície plana e de preferência sobre um vidro onde se possa verificar a progressão da frente de resina nas duas faces do laminado. É importante que as condições de temperatura e umidade sejam adequadas para laminação. É sempre interessante realizar testes com temperatura controlada e testes nas condições reais onde a peça vai ser produzida.

A melhor opção para a dimensão das placas de teste é de 1200 mm x 600 mm, onde um freio de baixa permeabilidade é colocado perto da linha de captação de vácuo. Os tubos espirais que ajudam a distribuir a resina, as entradas de resina e saída de ar devem ser posicionadas da mesma forma que serão utilizados no projeto real e todos os materiais devem ser recobertos com uma camada de tecido desmoldante de nylon do tipo peel ply. A bolsa de vácuo deve então ser acomodada e fixada com a fita selante tipo tacky tape.

Vincos devem ser feitos na bolsa para permitir um melhor ajuste e evitar deformações. Não deve haver passagens livres entre a bolsa e as bordas do painel para não haver fuga da frente de resina. É sempre importante lembrar que a frente de resina permeia mais rápido onde existe menos resistência. Deve-se então conectar as mangueiras à entrada de resina e à saída de ar e garantir que não haja espaço para vazamentos.

É essencial que haja um cronômetro para acompanhamento do tempo que a resina leva para permear o laminado. É aconselhável também que o processo seja filmado ou fotografado periodicamente. Um medidor de pressão de vácuo instalado no sistema é aconselhável para acompanhar o nível de vácuo durante a infusão sendo, entretanto, necessário colocar algum obstáculo (uma camada de material) entre o medidor de pressão e o molde para que a aplicação do vácuo não colapse a bolsa ao seu redor e impeça o monitoramento da pressão. 

É necessário garantir que não haja uma queda significativa de pressão durante o teste e que a bolsa não apresente vazamentos. O objetivo do ensaio para determinar a permeabilidade do laminado é medir qual a distância que a resina é capaz de percorrer em intervalos regulares de tempo. Usualmente, a cada minuto deve-se marcar a posição da frente de fluxo.

Com as informações coletadas durante o teste, é possível calcular o valor de L² para cada uma das distâncias percorridas. O coeficiente L²/t pode ser então determinado pela equação:

Onde ti é o tempo na i-ésima distância, chamada de Li. Os símbolos e se referem às médias de tempo e distância, respectivamente, de todos os dados coletados. Após o cálculo do coeficiente L²/t, todas as informações necessárias para o cálculo da permeabilidade pela Lei de Darcy já foram determinadas.

Tipos de Groovings

Uma pergunta que recebemos quase que diariamente na Barracuda é “Qual o tipo de grooving (Corte) mais eficiente na construção náutica” e resposta é que não existe um corte que seja essencialmente melhor do que os outros. Existe uma grande variedade de groovings e suas eficiências dependem do processo de laminação e da geometria da peça a ser laminada.

O primeiro tipo de corte que podemos exemplificar é o GSP, que é a nomenclatura utilizada para placas planas sem nenhum tipo de ranhura. Esse tipo de placa é muito utilizada como núcleo de longarinas das embarcações, principalmente nas menores densidades como 40, 45 e 60 kg/m³.

A placa GSP tem uma variação chamada GSP Perfurada, indicada para laminação por vacuum bagging. As perfurações na placa permitem que todo o ar que possa ter ficado enclausurado nas primeiras camadas de tecido e também entre o tecido e o núcleo possa ser retirado.

A placa do tipo GSP Perfurada também pode ser utilizada na laminação com tecidos pré-impregnados (prepregs) mas é sempre necessário prestar bastante atenção na temperatura de distorção térmica do tipo de espuma que está sendo utilizado para que não aconteçam deformações durante a cura do prepreg, que precisa ser realizada em alta temperatura.

Outro tipo de corte muito comum é o DC, ou “Double Cut”, que é projetado para laminação manual e recebe ranhuras nas duas faces.

As ranhuras das placas DC são profundas e chegam a pouco mais do que a metade da espessura da placa e como o núcleo é fixado na camada externa do laminado com adesivo de colagem, essas ranhuras devem ser suficientes para que o adesivo preencha essa área e o excesso passe para a face de cima da placa através dos furos ocasionados pelo encontro dos frisos nas duas faces.

As placas ranhuradas para infusão recebem o nome de DCI, que significa “Double Cut infusion”. Nesse caso, as ranhuras são muito menos profundas que as das placas DC e devem ser suficientes para aumentar a permeabilidade do laminado e garantir que toda a peça possa ser impregnada com sucesso.

Esse tipo de placa também recebe perfurações para que a resina consiga fluir bem nas duas faces e as frentes de avanço de resina estejam sempre iguais nas faces de baixo e de cima da placa.

Esse tipo de corte deve ser muito bem feito, pois quando a qualidade do corte é ruim ou a espessura e profundidade dos frisos são grandes demais, esses frisos acumulam muita resina, o que gera acúmulo de calor e é muito provável que a peça fique com sua superfície marcada.

E, por último, outro tipo de corte também muito comum é o GS que é projetado para moldar em áreas curvas.

Esse tipo de placa é frisada somente em uma das faces e os frisos tem a profundidade quase igual a espessura da placa. A face de baixo da placa recebe uma tela de poliéster que garante que a placa não se separe quando flexionada.

Esse corte é muito utilizado em infusão a vácuo, principalmente em energia eólica e também para laminação manual. Quando utilizada no processo de infusão a vácuo, é muito importante que sejam realizados testes de permeabilidade na placa com cortes tipo GS, para garantir que todo o laminado seja impregnado.

Flow Model

Quando o objetivo é realizar uma grande infusão, um pequeno erro no dimensionamento ou posição das linhas de vácuo e resina pode causar a perda total da peça e um grande prejuízo. Por esse motivo a utilização de simulações computacionais se torna fundamental para garantir o sucesso do processo.

O objetivo da simulação é determinar com precisão o melhor layout de infusão e o tempo exato que a resina levará para impregnar todo o laminado. Como premissas, o programa leva em consideração a geometria da peça, a pressão de vácuo aplicada, a viscosidade da resina, a porosidade das matérias primas e a permeabilidade do laminado.

O sucesso da simulação depende da qualidade dos dados utilizados na simulação. Para começar, o modelo 3D da peça deve ser completamente fiel a peça final para que toda a geometria seja levada em consideração.

A diferença de pressão exercida pelo vácuo também deve ser fiel a utilizada na infusão final. Podemos simular uma super infusão levando em conta 1 atmosfera negativa de pressão sobre o laminado e na hora da infusão utilizarmos uma bomba de vácuo ineficaz e um molde cheio de vazamento que nunca serão capazes de entregar o resultado esperado.

Outro fator muito importante é a temperatura ambiente na hora da infusão, é sabido que as resinas costumam dobrar a viscosidade a cada 5°C a menos do que a temperatura informada no datasheet e reduzir na metade a viscosidade a cada 5°C a mais. Com isso é muito importante que a resina fique condicionada à temperatura mais próxima possível dos 25°C em fábricas situadas em lugares com temperaturas ambiente muito altas ou muito baixas.

Os dados de porosidade e permeabilidade precisam ser medidos através de testes práticos de infusão em corpos de prova. Esses testes precisam ser realizados em todos os tipos de laminados da peça e os dados gerados serão utilizados para alimentar a simulação de fluxo e com isso determinar a velocidade e comportamento da infusão em toda a peça.

Com todos esses dados corretamente inseridos, o programa irá utilizar uma versão da Lei de Darcy para determinar com exatidão o tempo final da infusão e o comportamento da frente de resina, possibilitando que o construtor não corra riscos durante a construção da peça final.

O Processo de Laminação Manual

Uma das escolhas mais importantes ao se construir um barco de materiais compostos é o processo a ser utilizado. Isso porque ele pode definir o teor de fibra, a qualidade e a espessura final do laminado além de características relacionadas à produção, como o tempo de laminação, capacidade de repetibilidade e automatização e mão-de-obra necessária.

O método de laminação manual utilizando moldes tipo fêmea é, sem dúvida, o método mais antigo utilizado na produção de barcos em fibra de vidro. É muito utilizado ainda hoje por construtores que acreditam que podem obter sucesso, inclusive financeiro, utilizando uma tecnologia de meio século atrás. 

Na maioria das construções por laminação manual os reforços usados são as formas básicas de vidro tipo E, como mantas e tecidos nas formas de combinados multiaxiais. É perfeitamente possível também utilizar reforços de fibras de alta performance com esse processo, mas outros métodos de produção mais sofisticados, que envolvem o uso de pressão e temperatura, e que requerem um maior controle da qualidade final do laminado são mais indicados para o uso destes materiais. 

A primeira etapa do processo de laminação manual é a aplicação de cera desmoldante para garantir a separação entre a peça laminada e o molde. É preciso realizar o pré-corte dos tecidos, mantas e materiais sandwich.  É importante ressaltar que é necessário do uso de sobreposições de no mínimo 50 mm na laminação de reforços de vidro, mas que não é incomum que essas sobreposições sejam maiores para acelerar o processo, o que faz com que a peça final tenha um peso maior que o esperado. 

Com o desmoldante aplicado e os reforços preparados, é necessário aplicar o gelcoat sobre o molde e então realizar a laminação do skin coat. Só então se inicia o processo de laminação dos reforços estruturais.  A quantidade e deposição dos reforços deve ser feita em estágios que dependem não só do gel time da resina, mas também do tipo de resina e das condições ambientais. 

A técnica básica de laminação se resume em utilizar resina suficiente para impregnar as mantas e tecidos previamente cortados, pressionando-os firmemente em sua posição. Depois da impregnação, o laminado pode ser compactado com o rolo de metal para remover qualquer bolha de ar que esteja presa. Os rolos devem ser usados molhados em resina, fazendo movimentos de ida e volta na extensão da área de trabalho à medida que a manta seja impregnada.

Logo que a resina inicie o estado de gel, o trabalho deve ser interrompido ou o laminado poderá se mexer, possibilitando a criação de espaços vazios. É necessário então limpar a ferramentas de laminação antes que a resina gelifique. 

Não é coerente falar que o processo de laminação manual não é capaz de produzir barcos viáveis sendo que ele é utilizado por diversos estaleiros há muitas décadas. No entanto, é importante ressaltar seus pontos fracos. As propriedades finais das peças dependem muito da habilidade do laminador, o que significa também que a repetibilidade do processo é bastante limitada. A quantidade de vazios dentro do laminado é grande, o que prejudica a qualidade das peças. Além disso, o teor de fibras máximo que pode ser alcançado é de 40%, produzindo um laminado com excesso de resina e excesso de peso, por consequência. 

Construção de Modelos

Como me disse um grande construtor, a fabricação de moldes se enquadra no conhecido enunciado de que para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, rápida e errada! Ao contrário do que muita gente pensa, a construção de moldes não é uma arte mas sim uma ciência. Existe um script que funciona e se você segue esta receita a chance de sucesso é grande. Qualquer tentativa de cortar caminho é certeza de que em alguma hora você vai se deparar com um problema, que na maioria das vezes tem uma solução cara.

Ter um projeto adequado com as linhas geradas por computador e cortado com precisão de 0.001% é como os construtores profissionais fazem hoje em dia. Já foi o tempo que se construía um modelo de um barco de 30 pés a partir de um casco antigo de 20. Depois pegava o casco de 30 pés, cortava no meio e crescia mais 10 pés e aí tinha um barco de 40 pés. Já vi uma vez um barco de 65 pés ser construído a partir de um casco velho de 34 pés. O resultado desta empreitada eu não preciso nem dizer.  O problema é que muita gente da velha guarda ainda não consegue visualizar as vantagens de se ter um sistema onde o projetista pensa e o construtor executa. Muitos construtores do passado têm enorme dificuldade de entender um plano de linhas ou um desenho 3D e preferem virar um casco antigo de cabeça para baixo e começar uma incrível operação de estica-e-puxa.

Um bom projeto é fornecido com as seções ajustadas para o corte em CNC em madeira prensada do tipo MDF. Em seguida a montagem da base e das cavernas são feitas com precisão milimétrica. Depois o casco é forrado com ripas longitudinais e madeira de modo que se tenha uma superfície exata e fiel do desenho do projetista. Sobre esta superfície é aplicada algumas camadas de fibra de vidro e depois massa. Muita massa e muita lixa. Mais lixa do que massa. Quando a superfície estiver impecável é aplicada a última camada de tinta que vai deixar o modelo pronto para a fabricação do molde. Como este mesmo construtor diz, só improvisa quem já fez certo um milhão de vezes.

Aspecto Cosmético dos Laminados

O sucesso comercial de muitas peças produzidas com materiais compostos laminados está atrelado ao seu apelo estético, tanto em barcos quanto em aviões e automóveis. No processo de laminação manual, a primeira camada sobre o molde é o gelcoat e em seguida é aplicado o skin coat, que pode variar caso a caso entre 600 g/m² e 900 g/ m² de manta de fibra de vidro e resina poliéster.  

Usar um laminado mais espesso no skin coat é aceitar ter uma penalização de peso mas também reduz a possibilidade de ter boa parte do laminado impresso pelo lado externo do laminado. O skin coat deve ser aplicado com uma resina de comprovado alto valor de HDT (temperatura de distorção térmica) para suportar sem prejuízos a liberação do calor causada pela cura exotérmica da resina de laminação que pode causar temperaturas de até 80°C.

O laminado do skin coat deve ser composto por mantas de fibra de vidro, mas neste ponto existe um dilema que deve ser enfrentado cedo ou tarde por qualquer construtor. A função básica das camadas cosméticas do laminado é proporcionar um acabamento exemplar e fornecer uma barreira para evitar a osmose quando é necessário o contato com água e umidade. No entanto, quanto de fibra e resina é o suficiente?

Poucas camadas podem comprometer o acabamento estético, mas muitas camadas podem comprometer o peso final da estrutura. Um skin coat à prova de problemas cosméticos pode ser executado com duas camadas de manta 300 g/m² e mais duas camadas de manta 450 g/m². A próxima camada a ser laminada pode então ser um tecido biaxial combinado com manta que deve ter entre 225 e 300 g/m². Nesta configuração, o construtor vai ter um laminado de baixa resistência com 5 kg/m² de peso sem contar o gelcoat, o que representa o acréscimo de quase 800 kg no casco de um barco de 60 pés de comprimento.

O uso de um processo estável de laminação, como a infusão, possibilita ao construtor reduzir ao máximo a gramatura da camada de acabamento externo. Em alguns casos, é possível usar somente uma manta de 300 g/m² que vai ser depositada junto com o restante do material de infusão. Um outro ponto a ser considerado durante a elaboração do skin coat é que laminar manualmente uma grande quantidade de fibra sobre o gelcoat significa um consumo de energia e tempo gigantesco.

Laminando com Resinas Éstervinílicas

As resinas éstervinílicas possuem características mecânicas e custos intermediários entre as resinas poliéster e epoxy. A química dessas resinas foi desenvolvida no final da década de 1950 e início de 1960 por vários pesquisadores e cada uma delas teve uma formulação diferente. As primeiras eram tão reativas que não tinham tempo de vida suficiente para serem utilizadas. É importante salientar que a resina éstervinílica tem sua origem numa resina epoxy, que utiliza um radical bisfenol do tipo A e epicloridrina. As resinas éstervinílicas utilizam um substrato diluído em derivados acrílicos e monômero de estireno.

Ao contrário das resinas poliéster que são formadas a partir de repetidas moléculas de ésteres, as éstervinílicas apresentam essa estrutura apenas na ponta de suas cadeias, o que fornece propriedades superiores. Os grupos ésteres são ligações fracas e podem ser atacadas pela água, o que resulta em baixa resistência química e na hidrólise. No cotidiano da náutica, isso pode ser observado por meio dos problemas de blistering em barcos, que são a formação de bolhas devido à degradação da matriz de resina pela ação da água.

Outras vantagens em relação a presença de grupos ésteres apenas na ponta das cadeias é a garantia de maior capacidade de deformação, maior resistência ao impacto e maior vida útil sob fadiga. As resinas éstervinílicas possuem excelente desempenho mecânico, dureza e boa resistência à hidrólise e a produtos químicos básicos já que têm como base resinas epoxy. No entanto, seu processamento é um pouco mais difícil em comparação à resina poliéster e seu custo um pouco mais alto.

O mecanismo de cura dessas resinas é muito similar ao das poliéster insaturado, pois utilizam o mesmo solvente de estireno. O processo de gelificação e a cura da solução das resinas de poliéster ou estervinílicas acontece através de uma reação onde há liberação de radicais livres. Para tanto, usa-se um catalisador do tipo peróxido, que inicia uma reação de ligações cruzadas responsável pela formação da matriz tridimensional.

Quando a reação cruzada começa, o movimento da solução se torna restrito depois de determinado tempo, saindo do estado líquido para o estado de gel. Esse tempo é chamado de gel time, que é efetivamente o tempo que se tem para trabalhar a resina. Nessa reação cruzada (cross-link), as cadeias de polímeros começam a se ligar ao monômero de estireno e este a outros pontos com duplas ligações, e assim sucessivamente, formando um sólido, uma massa compacta que não irá se fundir mesmo com a exposição à temperatura, por isto ele é chamado de termofixo.

Laminação por Vacuum Bag

Apesar de o método de laminação manual ser capaz de entregar laminados com boa resistência, durabilidade e aparência cosmética, o uso de vaccum bag é capaz de fabricar uma estrutura mais leve e mais forte. A ideia é usar a pressão atmosférica para compactar o laminado durante o processo de cura.

É possível realizar a laminação de peças sólidas ou utilizar esse método para colagem de materiais sandwich. O processo consiste em posicionar os reforços e impregnar manualmente o laminado com resina antes de revesti-lo em uma bolsa plástica, que é conectada a uma bomba de vácuo usada para remover o ar existente dentro da cavidade do molde. Para esse processo pressões entre 0,4 e 0,6 atm são suficientes.

Esquema de laminação a vácuo

Entre o laminado e a bolsa de vácuo há alguns outros materiais descartáveis essenciais para o sucesso do processo. A começar pelo tecido de poliamida, chamado de peel ply, posicionado em contato direto com o laminado e que possui a função de desmoldante e facilita a retirada dos demais materiais descartáveis após o processo de cura. Acima do peel ply deve ser colocado um filme perfurado, usado para deixar passar ou bloquear a passagem de resina, já que normalmente se utiliza umva quantidade de 3% a 5% maior de resina do que o projetado para facilitar a impregnação inicial e que deve ser retirada durante a aplicação de vácuo.

Em sequência, é posicionado um material absorvente, chamado breather, que tem a finalidade de absorver a resina que que o filme perfurado deixou passar e homogeneizar a distribuição de vácuo. Finalmente a bolsa de vácuo fecha o envelope e deve ser fixa no molde com a tacky tape, uma fita emborrachada dupla face que tem cerca de 12 mm de largura.

Todos os materiais descartáveis devem ter resistência a temperatura e aos solventes emitidos pelas resinas durante o processo de cura exotérmica. Para resinas que curam a temperatura ambiente, os materiais devem ser especificados para uma operação mínima de 80°C.

Como a impregnação dos reforços deve ser feita de forma manual, dependendo das dimensões do laminado esse processo toma bastante tempo. Por esse motivo é preciso utilizar uma resina com gel time alto, normalmente epoxy, o que aumenta o custo do processo.

Apesar do custo dos materiais descartáveis, da bomba de vácuo e da resina, o processo é capaz de entregar um teor de fibra de cerca de 50%, maior que os 40% da laminação manual e da faixa de 20 a 30% obtida pelo spray-up. Por esse motivo a estrutura fica mais leve e tem aumentos consideráveis nas propriedades mecânicas. Além, é claro, de que o uso de vácuo para compactação das fibras também diminui a quantidade de vazios e melhora a qualidade do laminado.