Materiais Consumíveis – Parte 2

O post da última semana descreveu os materiais consumíveis necessários para a laminação utilizando o processo de vacum bag. O processo de infusão a vácuo, apesar de com partilhar a maior parte dos materiais com o processo anterior, possui algumas diferenças.

As semelhanças, no entanto, estão no uso da tacky tape, bolsa de vácuo e peel ply. Os materiais utilizados são os mesmos e são selecionados da mesma maneira, sempre em função da temperatura de pico da cura exotérmica da resina.

As diferenças começam com o breather, que normalmente não é utilizado pois na infusão o gradiente de pressão tem o papel de inserir a resina no laminado, portanto não há excesso de resina a ser absorvido. Esse consumível aparece somente em infusões realizadas com duas bolsas, com o objetivo de distribuir a vazão de ar uniformemente por toda a superfície do molde.

O release film, ou filme perfurado, é utilizado apenas em dois casos. O primeiro é a infusão de laminados sólidos e o segundo é nas regiões onde são montadas as linhas de resina. Na laminação por vacum bag, o filme perfurado era responsável por ajudar na desmoldagem dos demais consumíveis e por controlar a resina que sairia do laminado.

Na infusão, o filme perfurado ainda é um elemento facilitador da desmoldagem d os demais consumíveis, mas também é responsável por controlar a quantidade de resina que entra no laminado e, por essa razão, sua área aberta costuma ser maior e variar entre 1,0 e 1,5%.

Outro consumível utilizado na infusão é o flow media, chamado também de tela de infusão, que possui alta permeabilidade e distribui rapidamente a resina pela superfície do laminado. Isso facilita muito a impregnação de locais com baixa permeabilidade e torna possível a infusão de laminados sólidos.

As linhas de entrada de resina são elementos essenciais para a realização de uma infusão de sucesso. A montagem dessa estrutura ocorre logo acima do peel ply e se inicia com o posicionamento de uma faixa de filme perfurado ao longo de todo o seu comprimento.

Acima do filme perfurado é aconselhável que se coloque uma faixa de flow media para que a resina se disperse facilmente ao longo de toda linha. Já a linha de resina em si é construída com um spiraduto envolvido em peel ply. O peel ply protegerá a bolsa de vácuo do contato com partes pontiagudas do spiraduto, evitando perfurações e vazamentos.

No centro da linha de resina, ou onde o plano de infusão determinar, deve ser posicionada uma conexão T que estará conectado à mangueira cristal que fará o transporte da resina. Essa mangueira deve ser preparada para ser submetida a pressão negativa, de modo que não colapse no momento em que a bomba de vácuo seja ligada. A fim de evitar vazamentos, a conexão da mangueira com o T deve ser isolada com tacky tape.

A saída de vácuo é construída de forma similar com spiraduto envolto em peel ply e uma conexão T ligada a uma mangueira cristal que é conectada à bomba de vácuo. Em geral, as linhas de vácuo são posicionadas em cima de um freio, ou uma área de baixa permeabilidade que serve para desacelerar o fluxo de resina e que normalmente será retirado da peça final. O freio evita que a resina entre na saída de vácuo e diminua a pressão aplicada à peça.  Para facilitar a desmoldagem da linha, é comum que uma faixa de release film seja posicionada abaixo da linha de vácuo, apesar de não ser absolutamente essencial. Outro elemento importante para a infusão são os registros, que controlam o fluxo de resina e de ar dentro da peça e devem estar conectados às mangueiras.

O construtor deve ter em mente que o custo dos consumíveis representa apenas uma pequena fração do valor total dedicado a construção em composites e que a integridade da peça final depende da confiabilidade desses materiais durante o processo de infusão, então sua seleção deve ser feita de maneira criteriosa pensando nas temperaturas e esforços que eles irão suportar. Mais detalhes sobre o uso correto desses materiais podem ser vistos no vídeo sobre o Teste de Permeabilidade.

Materiais Consumíveis – Parte 1

O uso de vácuo para compactação de laminados aumenta o teor de fibras e diminui os vazios presentes nas estruturas, melhorando sua confiabilidade e propriedades mecânicas. Por essa razão, muitos estaleiros costumam adotar os métodos de laminação por vacum bagging ou infusão a vácuo.

Para construir embarcações utilizando esses métodos, é preciso mais do que apenas as fibras e resina. Para que aplicar pressão negativa no laminado é necessário utilizar uma classe de materiais chamada de consumíveis, que são utilizados durante o processo de compactação e descartados após a laminação.

Apesar de compartilharem muitos desses materiais, existem algumas diferenças entre o conjunto de consumíveis necessários para os processos de vacuum bag e de infusão a vácuo. O post dessa semana é dedicado a explorar os materiais necessários para o primeiro processo e, na próxima semana, serão caracterizados os materiais necessários para infusão a vácuo.

A primeira característica que o construtor deve ter em mente ao selecionar os materiais consumíveis é a temperatura que eles devem suportar, que depende da temperatura de pico que a resina alcança durante a cura exotérmica. Existes conjuntos de consumíveis que suportam temperaturas entre 100 e 200°C além daqueles desenvolvidos para pós-cura, que podem alcançar até 250°C. Em geral, os construtores de embarcações podem utilizar produtos que operam na faixa entre 120 e 180°C.

Ao preparar a laminação, o primeiro material que deve ser posicionado no molde é a tacky tape, uma fita adesiva emborrachada dupla face com 3 mm de espessura e 12 mm de largura. Sua função é fixar a bolsa de vácuo no perímetro molde sem permitir vazamentos, possibilitando a aplicação da pressão de vácuo sobre o laminado. A fita deve ser aplicada sobre uma superfície limpa e livre de desmoldante, além de ficar bem protegida durante todo o restante da montagem e laminação.

Depois da laminação das camadas de tecido de fibra, o próximo consumível a ser posicionado é o peel ply, um tecido desmoldante de fibras de poliamida ou poliéster. Suas principais funções são permitir a desmoldagem dos demais materiais consumíveis após a laminação e garantir que a face do que não está em contato com o molde tenha um acabamento superficial satisfatório.

A maior parte dos tecidos peel ply possuem tracers vermelhos e pretos que contrastam com o laminado e ficam visíveis mesmo após a impregnação dos reforços, quando a parte branca do material se torna transparente.

Depois do peel ply, o constructor deve posicionar o filme perfurado, chamado também de release film, já que ele também facilita a desmoldagem do restante dos materiais consumíveis. Sua principal função no processo de vacuum bag é controlar a quantidade de resina que é retirada do laminado e absorvida pelo breather.

A área aberta é uma variável importante nesse tipo de material e deve ser definida a partir da quantidade de resina que o construtor deseja retirar do laminado, da viscosidade dessa resina e da intensidade do gradiente de pressão utilizado. Em geral, filmes perfurados com áreas abertas até 0,3% são utilizados para laminações por vacuum bag.

O breather, por sua vez, é uma material absorvente feito a partir de fibras de poliéster não tramadas. Ele é responsável por distribuir o vácuo por toda a superfície da peça e por absorver a resina que passa pelo filme perfurado. A homogeneidade desse material é de extrema importância porque variações em sua espessura significam uma variação na quantidade de resina retirada do laminado. Isso faz com que o teor de fibra seja diferente dependendo da região do estrutura, o que é indesejável.

Entre o filme perfurado e o breather é interessante que seja posicionado um spiraduto de ½” ou ¾” que seja capaz de ajudar na distribuição da sucção causada pela bomba de vácuo. Ele deve estar ligado a uma conexão T que estará conectada a uma mangueira cristal e a um trap, onde a resina que deixar o laminado ficará armazenada. Todo esse conjunto de consumíveis deve estar preparado para suportar pressões negativas e não deve colapsar quando o vácuo for aplicado.

Por fim, acima de toda essa sequência de materiais, deve ser posicionada a bolsa de vácuo que é um filme de nylon com capacidade de elongação de 300% antes de se romper, além de uma resistência à tração de 55 MPa. Ele é fixado nas bordas do molde por meio da tacky tape de forma que não ocorra nenhum vazamento de ar, fenômeno que é monitorado assim como o explicado no post sobre Integridade do Molde.

O custo extra que o construtor tem para adquirir esses materiais é mais do que compensado pelo ganho de qualidade no laminado e economia de tempo de produção. Na próxima semana o post do blog abordará as particularidades dos consumíveis utilizados para realização da infusão a vácuo e mostrará como se montam as saídas de vácuo e entradas de resina.

Tipos de Fibra de Carbono

A construção das estruturas de materiais compostos como se conhece hoje só foi possível com o desenvolvimento das fibras de vidro em meados de 1940. As fibras de carbono apresentam uma revolução igualmente significativa para os composites estruturais, sendo um reforço mais forte, mais leve e mais durável que qualquer outro material disponível no mercado atualmente.

Desde a década de 1970, a indústria é capaz de produzir fibras de carbono a base de polímero de poliacrilonitrila (PAN) em grandes volumes, mantendo o desempenho, qualidade e consistência necessárias no processamento de materiais desenvolvidos para indústria aeronáutica, para onde elas foram originalmente desenvolvidas.

Na indústria náutica sua aplicação é destinada à peças que necessitam de uma eficiência estrutural muito alta ou que precisem ter baixo peso para que o centro de gravidade da embarcação não fique muito alto e prejudique a estabilidade da navegação. Ou seja, não são apenas os barcos de regata que fazem uso desse tipo de reforço, mas muitos estaleiros acabam utilizando fibras de carbono para construção de casarias e principalmente de hard tops.

Assim como existem diferentes variedades de fibra de vidro, existem diferentes variedades de fibras de carbono. A diferença entre elas se concentra principalmente na combinação entre resistência à tração e módulo de elasticidade, como indicado no Gráfico 1.

Gráfico 1. Classificação das fibras de carbono

As fibras de carbono de módulo padrão, conhecidas no mercado como fibras de Standard Modulus, possuem módulos de elasticidade até 230 GPa ou um pouco superior. São as fibras de carbono com melhor custo-benefício considerando tanto a resistência à tração quanto a rigidez do material, com fios construídos com 1k a 24k filamentos.

As fibras de módulo intermediário, ou Intermediate Modulus, possuem módulos de elasticidade que variam entre aproximadamente 290 e 330 GPa. Existe uma grande variedade dessa classe de fibras de carbono, que também são conhecidas como High Strength porque apresentam a melhor resistência à tração. A diferença entre os conceitos de resistência e módulo de elasticidade já foi abordada em vários tópicos e detalhes no blog. 

As aplicações das fibras de módulo intermediário são bastante amplas, incluindo as áreas aeroespacial, industrial, entre outras. Por sua ampla gama de opções, elas apresentam diversos preços e propriedades para atender as diferentes demandas desses mercados. Os fios dessa classe de fibras de carbono são construídos com uma quantidade de filamentos que varia ente 6k e 36k.

Por fim, as fibras de carbono de alto módulo, também chamadas de High Modulus, podem alcançar módulos de elasticidade de até 640 GPa. São normalmente utilizadas em aplicações onde a expansão térmica é um fator crítico, já que seu coeficiente de expansão é muito baixo. Isso inclui estruturas aeroespaciais e até mesmo artigos esportivos de altíssimo desempenho. Os fios das fibras de carbono de alto módulo são compostos por uma quantidade de filamentos que varia entre 3k e 12k.

Ao selecionar o melhor tipo de fibra de carbono para o seu projeto, o construtor deve também verificar qual o tratamento superficial a fibra recebeu, já que isso definirá qual o sistema de resina será compatível com os filamentos. Em geral esse tipo de reforço é compatível com sistemas de resina epoxy e, mais raramente, com resinas estervinílicas e poliéster.

As subclassificações dentro dos tipos de fibra de reforço são mais algumas das inúmeras variáveis que o construtor deve estar atento no momento de selecionar os melhores materiais para seu barco.

Madeira Balsa

A madeira balsa representou uma revolução na construção em materiais compostos, sendo o primeiro material de núcleo utilizando em uma construção sandwich na década de 1940. Apesar da teoria sobre a eficiência desse tipo de estrutura estar estabelecida há algum tempo, não foi isso que fez a madeira balsa entrar em cena.

Durante a Segunda Guerra Mundial, os esforços de guerra causaram uma escassez de aço em todo o mundo, obrigando todos os países a encontrarem alternativas. Foi um período em que os materiais compostos tiveram um grande desenvolvimento e foi quando a madeira balsa foi utilizada na construção do bombardeiro Havilland DH.98, a aeronave mais veloz da época.

O “Mosquito”, como era mais conhecido, foi construído em madeira balsa e madeira compensada. Como aconteceu com diversos materiais desenvolvidos nesse período, ao fim da guerra a construção náutica adotou o uso da madeira balsa também, incentivada por sua baixa densidade e excelentes propriedades mecânicas.

Em comparação com outras madeiras, a balsa é muito leve, chegando a ter 150 kg/m³, embora muitas versões possuam densidades acima de 250 kg/m³. Como sua microestrutura é formada por células dispostas na direção transversal à placa, as resistências à compressão e ao cisalhamento são relativamente altas.

A forma de balsa mais utilizada atualmente é a End Grain, madeira originária de florestas tropicais da América do Sul e cultivada principalmente no Equador.

Por ser um material orgânico, a sua densidade é muito variável. Para contornar esse problema, os fabricantes fatiam a madeira extraída em pequenos sarrafos que são colados para formar um bloco a partir do qual são fatiadas placas com quadrados de densidades parecidas, o que resulta em um material com densidade media equalizada, mas cada placa vai possuir um peso diferente.  

A facilidade de processamento da balsa também é uma vantagem. Ela pode ser utilizada em placas planas ou com groovings GS para conformação em curvaturas acentuadas. A maior parte dos construtores amadores trabalham com as ferramentas necessárias para o processamento dessa madeira e ela é compatível com diversos processos de laminação.

As maiores dificuldades relacionadas ao uso de balsa começam com sua alta absorção de resina. A mesma microestrutura celular que fornece ótimas propriedades mecânicas, é o que faz com que o núcleo tenha uma alta absorção de resina pelos poros e através dos cortes da placa e isto faz que o material absorva muita resina no processo de laminação.

Para reduzir esse problema, o construtor pode iniciar o processo de laminação depositando sobre a placa de madeira de balsa uma camada de resina de alta viscosidade com tempo de gel curto, selando sua superfície e impedindo a entrada excessiva de resina, o que aumenta o peso do laminado sem realmente trazer benefício estrutural.

As células abertas que absorvem resina também são as que possibilitam a entrada de água e umidade, que causam a degradação do material orgânico. Para evitar esse processo, a construção em balsa também exige o uso de resina epoxy, que possui uma resistência à entrada de água muito maior do que a poliéster ou a estervinílica. Porém, uma vez que ocorra a entrada de água, a degradação ocorre em alguns anos e o material deve ser substituído, muitas vezes por espumas PVC que são mais leves e possuem células fechadas que não absorvem umidade.

O construtor deve estar sempre atento ao utilizar esse tipo núcleo para construção de embarcações. Em geral, a balsa faz com que as estruturas fiquem mais pesadas e durem menos quando comparada à embarcações construídas com núcleos de espuma PVC.

Coremat e Soric

Existe uma grande variedade de materiais de núcleo a disposição dos construtores de embarcações e constantemente são discutidas no blog as vantagens do uso de estruturas sandwich e, em especial, do uso de espumas de PVC.

No entanto, para que haja uma adesão adequada entre as faces e o núcleo é necessário que essas espumas tenham ranhuras chamadas de groovings. Essas ranhuras, principalmente quando feitas com espessuras inadequadas, podem causar um problema muito conhecido para os construtores, o print-through.

O print-through é a impressão dos materiais de núcleo e principalmente das tramas das fibras na superfície do gelcoat. Esse fenômeno acaba prejudicando o acabamento dos cascos e demais estruturas da embarcação, criando defeitos estéticos nos laminados.

Alguns materiais de núcleo que têm um efeito superficial que podem impedir com esse fenômeno são o Coremat®e o Soric®, produzidos a partir de uma mistura de lã de poliéster com microesferas, responsáveis por aumentar o volume do reforco e diminuir a quantidade de resina necessária para impregnação completa do material. Estes materiais não podem ser comparados com espumas e honeycombs, já que suas espessuras não são capazes de desenvolver as tensões atuantes em uma estrutura sandwich de verdade, onde o núcleo deve pelo menos 6 vezes a espessura das faces. De qualquer forma, estes materiais funcionam no skin coat como um bloqueador de impressao das fibras (print blocker)

Além de ser uma material descrito como print blocker, o Coremat® permite a fabricação de laminados sólidos de maneira mais rápida e mais leve quando em comparação com as versões construídas apenas de resina e manta de fibra de vidro. Fornecido em espessuras entre 2 e 5 mm, sua densidade após impregnado fica entre 540 e 630 kg/m³. 

É importante destacar que o Coremat® é compatível com os processos de laminação manual e spray-up somente e não deve ser submetido à pressão negativa produzida por um sistem de laminação a vácuo sob hipótese nenhuma. Esse material possui mecanismos que impedem que ele absorva resina demais e algumas variedades ainda apresentam um indicador que muda de cor quando o núcleo está completamente impregnado.

Para impedir o print-through em processos de laminação à vácuo e infusão, o Soric® é uma opção de núcleo também feita a partir de lã de poliéster e microesferas, mas projetado para projetar as intensas cargas de compressão causadas para esses processos. Disponível em espessuras entre 1 e 5 mm, sua densidade após a impregnação varia entre 600 e 700 kg/m³.

O Soric® XF é formado por pequenas ilhas hexagonais que adicionam espessura ao laminado e são separadas por canais que agem como um meio de alta permeabilidade e ajudam a resina a se espalhar pela peça, atuando como uma espécie de flow media. Já o Soric® TF não possui essas ilhas hexagonais, sendo muito mais eficiente enquanto print blocker e também atuando como meio de alta permeabilidade.

O Coremat® e o Soric® são duas opções de núcleo a disposição dos construtores que, apesar de não serem capazes de adicionar espessura de forma tão eficiente quando às espumas PVC e nem mesmo possuírem as mesmas qualidades mecânicas, possuem funções específicas interessantes e bastante úteis para construção de embarcações.

Integridade do Molde

A infusão a vácuo e o vacum bag são dois dos principais métodos para construção de embarcações em série. O gradiente de pressão exerce diferentes funções no dois métodos, mas é essencial para o seu sucesso.

No processo de vacum bag, a pressão deve ficar entre 0,4 e 0,6 atm para que seja capaz de compactar o laminado e retirar o excesso de resina que já está presente nas camadas de reforço do laminado. Já no processo de infusão a vácuo, os níveis de pressão devem ficar o mais próximo possível de 1,0 atm para que seja possível transportar as frente de resina ao longo do laminado e garantir a impregnação completa.

Os principais elementos responsáveis pela criação e manutenção do gradiente de pressão são a bomba de vácuo, a bolsa de vácuo e o molde. O drop test é responsável pela avaliação da capacidade dos consumíveis de manter o gradiente de pressão, mas antes disso o construtor deve avaliar a estanqueidade e integridade do molde.

Para manter pressões entre 0,4 e 0,6 atm não existem tantos problemas, mas a partir de 0,8 atm qualquer defeito já pode causar vazamentos capazes de comprometer o processo de laminação. Mesmo a porosidade de um molde de 10 mm de fibra de vidro sólida pode causar vazamentos e o construtor deve fazer o possível para evitá-los ou, pelo menos, estar preparado para eles.

Para isso, após a fabricação do molde e antes da primeira laminação, o molde deve passar por um teste de integridade que deve ser iniciado em uma área que provavelmente não apresente vazamentos, ou seja, sem flanges ou emendas. Isolando um local com essas características de aproximadamente 2 m² é possível verificar se a construção do molde é resistente à vazamentos.

Para realizar o teste nessa área é necessário encerar o molde e isolar a área com tacky tape. Para que a bolsa de vácuo não fique diretamente sobre o molde, é necessário utilizar uma ou duas camadas de tecido biaxial ou breather. A linha de vácuo deve percorrer todo o perímetro da área de teste e deve ser incialmente regulada para uma pressão de 0,3 atm para que a bolsa tenha algum tempo para se ajustar. Quando tudo estiver na posição correta, a pressão deve ser ajustada para 1,0 atm e deve-se realizar uma nova revisão do sistema.

Um aparelho de ultrassom deve ser utilizado para procurar vazamentos, inspecionando o perímetro da tacky tape, todas as conexões válvulas, registros e mangueiras acopladas ao sistema da bomba de vácuo. Garantindo que todos esses elementos estejam sem vazamento, a bomba deve ser desligada e o sistema isolado deve ser capaz de manter a pressão próxima de 1 atm por 30 minutos.

Se ocorrer uma queda de pressão maior que 0,1 atm em cinco minutos, o construtor deve saber que a probabilidade de insucesso é grande e deve procurar reparar o molde. Se o sistema for capaz de manter a pressão, a área de teste deve aumentar progressivamente até atingir toda a área do molde. Áreas com inserts de vigias, gaiutas e os flanges são mais propensas a vazamentos e devem ser cuidadosamente avaliadas.

Alguns construtores podem apresentar certa resistência para realizar o teste de integridade e estanqueidade do molde, já que ele pode ocupar um dia inteiro na produção, mas é importante compreender que ele é capaz de evitar o desperdício de dezenas de milhares de reais em materiais de construção e que a qualidade da peça final aumentará significativamente quanto maior o gradiente pressão alcançada na infusão a vácuo.

Infusão de Laminados Sólidos

As variáveis do processo de infusão a vácuo já foram extensivamente discutidas em diversas ocasiões no blog, sobretudo no post sobre o teste de permeabilidade, propriedade que está intimamente relacionada com a velocidade do avanço da frente de resina.

Normalmente, a infusão de cascos e conveses é realizada com um tempo de infusão entre 30 e 50 minutos dependendo do tamanho da peça e também por conta do tempo de gel típico das resinas poliéster e estervinílicas. Isso não é nenhum problema em laminados sandwich com núcleos de espuma PVC que possuem alta permeabilidade e são um meio poroso por onde a resina pode viajar com facilidade.

No entanto, existem regiões do casco que são construídas em laminados sólidos sem a presença desse meio de alta permeabilidade, como é o caso do fundo de alguns barcos ou por necessidade de instalação de ferragens. Isso não impede que essas regiões sejam infundidas, mas o construtor deve ter alguns cuidados a mais.

É muito mais difícil para resina atravessar múltiplas camadas de reforço compactadas por meio de um gradiente de pressão do que atravessar laminados sandwich que têm alta permeabilidade. O construtor deve ter em mente que o avanço da frente de resina é muito mais lento e deve adotar estratégias para que a infusão ocorra no tempo correto.

O construtor pode adaptar sua estratégia de infusão inserindo mais linhas e entradas de resina, fazendo com que a resina tenha um caminho menor a percorrer antes do produto alcançar o ponto de gel. No entanto, é muito mais comum que os construtores recorram a um consumível chamado tela de infusão.

A tela de infusão é um material de alta permeabilidade que rapidamente distribui a resina ao longo da superfície do laminado, fazendo com que a impregnação ocorra através da espessura e não somente através da comprimento. Uma das grandes desvantagens do uso desse consumível é que o acabamento superficial da face de laminado que não está em contato com o molde fica ligeiramente rugoso, mas isso não é um grande problema estrutural de embarcações que precisam de acabamento perfeito em apenas um dos lados.

Na montagem da infusão, além da tela o construtor deve inserir um filme perfurado entre o peel ply e a bolsa de vácuo. Diferente do filme perfurado utilizado no processo de vacum bag que controla a saída de resina que será absorvida pelo breather, esse release film possui a função de controlar a entrada de resina no laminado e facilitar a posterior desmoldagem da tela. A área aberta, então, é naturalmente maior sendo que os filmes para vacum bag possuem cerca de 0,15% de área aberta enquanto os de infusão alcançar valores próximos de até 1,8%.

Após o posicionamento do peel ply, filme perfurado e tela de infusão, é importante montar as linhas de entrada de resina em cima da tela, para que a resina entre em contato com o meio de alta permeabilidade assim que entrar no laminado.

Outra característica importante que o construtor deve estar atento no momento de selecionar a tela certa é a facilidade em acomodar o material durante a montagem. Uma tela de trama tridimensional com alta permeabilidade e facilidade de moldagem é a mais indicada. É importante também que sejam realizados testes de permeabilidade com laminados equivalentes aos que serão utilizados para fabricação das peças estruturais para que se tenha dados sobre a velocidade do avanço de resina nas condições de produção reais.

O Primeiro Barco em Fiberglass

Muitos dos avanços tecnológicos da história foram impulsionados por grandes conflitos da humanidade. A história do desenvolvimento da resina poliéster, da invenção da fibra de vidro e até mesmo do uso de painéis sandwich já foram contadas no blog e estão intimamente ligadas aos acontecimentos da II Guerra Mundial. O post de hoje fala sobre como todos esses avanços criaram os elementos necessários para a construção do plástico reforçado com fibra de vidro, materiais que hoje dominam a indústria náutica.

Antes do desenvolvimento dos plásticos termofixos, os barcos eram em sua maioria construídos com materiais orgânicos como madeiras e peles de animais. Plywood estava começando a se popularizar no século XX, mas havia um ímpeto para a criação de um método que pudesse realizar a construção de toda a embarcação de uma só vez e permitir a moldagem de geometrias complexas com duplas curvaturas.

O responsável pelo criação desse procedimento é o engenheiro Ray Greene que, apesar de ter construído milhares de embarcações durante sua vida, gostava de se definir como um inventor e não como um construtor de barcos. Seu amor por embarcações se aprofundou principalmente depois que seu pai comprou uma propriedade no Michigan próxima da Transverse Bay, onde ele e seus irmãos aproveitavam tudo que a baía tinha a oferecer.

Seu vontade de entender os fenômenos da química criou episódios interessantes desde sua infância, quando destruiu a pia da cozinha tentando produzir refrigerante em sua casa utilizando gelo seco e desprezando a expansão dos gases em um recipiente fechado. Seu rigor e vontade de alcançar o melhor resultado possível podem ser explicados a partir da admiração que tinha pelo seu pai, que trabalhava como chefe de metalurgia e diretor de pesquisa em uma companhia em Ohio.

Herman Greene era seu incentivador ao mesmo tempo que era extremamente exigente com seu trabalho. O primeiro barco que Ray construiu quando tinha 12 anos foi imediatamente jogado fora depois que ficou pronto, já que seu pai ficou decepcionado com o resultado. Por outro lado, Herman deu as ferramentas e o apoio necessário para que o filho pudesse fundar o estaleiro Ray Greene & Company na garagem da família em 1929, o que permitiu que fabricassem os barcos que pagariam pelo seu curso superior em engenharia mecânica e química. Posteriormente, seria o que também permitiria que os irmãos de Ray fossem para faculdade após a morte de seu pai em 1934.

Foi na Universidade de Ohio que Ray começou a estudar resinas sintéticas, justamente com o objetivo de criar um método que permitisse a construção de embarcações leves e resistentes. As primeiras tentativas foram realizadas utilizando plásticos que necessitavam de curas em condições controladas de temperatura e pressão em autoclaves, limitando o tamanho das embarcações.

O resultado que buscava foi alcançado durante o desenvolvimento de sua tese de mestrado que originalmente se chamava “Choosing Plastics for Boat Building”. Ao receber o primeiro rascunho, seu orientador questionou se o trabalho era sobre engenharia mecânica ou arquitetura naval e sugeriu uma pequena mudança no título que se tornou “Chooosing Plastics for Large Objects”, sem mencionar em nenhum momento que o primeiro grande objeto construído em composites foi um barco.

Todas as matrizes poliméricas que Ray havia experimentado até o momento eram frágeis e apresentavam pouca resistência, deixando evidente a necessidade de um material de reforço. Depois de tentar uma infinidade de opções, suas conexões com a Owens-Corning lhe renderam a metade do primeiro lote de fibra de vidro que a empresa produziu em 1941.  

Por meio de colegas pesquisadores que trabalhavam na American Cyanamid, Greene conseguiu também um galão da primeira resina termofixa capaz de ser curada em temperatura ambiente. Sendo o primeiro homem no mundo com esses dois elementos em mãos simultaneamente, ele foi o responsável por criar os procedimentos para construção da primeira grande peça estrutural de plástico reforçado com fibra de vidro, dando o primeiro passo em direção aos composites como se conhece hoje em 1942 e revolucionando a indústria náutica.

Décadas mais tarde, seu orientador contou que o tema de sua tese, a seleção de plásticos para construção de peças estruturais, foi motivo de dúvida entre os professores do departamento, que permitiram que o trabalho prosseguisse apenas por conta do entusiasmo do estudante. Vários fabricante de polímeros na época responderam aos pedidos de Ray Greene informando que a ideia de utilizar plásticos em peças estruturais era simplesmente impossível.

Com seu ímpeto de cientista-físico-inventor, conhecimento profundo sobre construção náutica e disciplina desenvolvida pelos altos padrões de exigência de seu pai, Ray Greene não encontrou apenas uma maneira de construir embarcações com plásticos reforçados com fibra, como criou uma indústria que revolucionou a construção de estruturas de alto desempenho.

O livro Processo de Infusão a Vácuo traz mais informações e curiosidades sobre a história dos materiais compostos, além de informações sobre as propriedades mecânicas dos composites e sobre os principais processos de fabricação.

A Eficiência Estrutural

Diversos posts no blog falam sobre quão eficiente são os materiais, mas afinal como é possível definir a eficiência estrutural? E finalmente fica a dúvida: os materiais compostos são eficientes em relação ao que?

Por definição, “eficiência” é a capacidade de evitar desperdícios de recursos para realizar uma tarefa ou produzir o resultado desejado. O requisito de uma estrutura é resistir a uma determinada tensão apresentando um nível de deformação dentro de um limite. Quanto menor o peso necessário para realizar essa tarefa, menor será o desperdício de recursos, sejam materiais ou financeiros, e assim sua eficiência será maior.

Antes de aprofundar o conceito de eficiência, é interessante mostrar os materiais com os quais os composites são comparados. O Gráfico 1 apresenta a resistência à tração das principais fibras de reforço em comparação com os materiais isotrópicos de engenharia mais comuns, incluindo aço, alumínio e madeira.

Gráfico 1. Resistência à tração dos materiais de engenharia

Todas as fibras de reforço superam os materiais isotrópicos, exceto o aço, que é superado apenas pela fibra de carbono HS, desenvolvida para fornecer a maior resistência à tração possível. O Gráfico 2 apresenta o módulo de elasticidade dos materiais, mostrando que o aço possui rigidez maior do que todos os outros materiais.

Gráfico 2. Módulo de elasticidade de materiais de engenharia

Alguns podem se perguntar porque seria interessante construir estruturas com plásticos reforçados com fibra de vidro se o aço apresenta comportamento mecânico melhor. É nesse contexto que o conceito de eficiência volta à cena, começando com uma comparação entre as densidades desses materiais feita no Gráfico 3.

Gráfico 3. Densidade de materiais de engenharia

As fibras de reforço são todas significativamente mais leves (baixa densidade) que os materiais metálicos. A madeira que apresenta as piores propriedades mecânicas em comparação aos demais materiais MAS é ainda mais leve que as fibras. Para comparar o quanto os materiais podem resistir por unidade de peso, é preciso então calcular as propriedades específicas Pesp, que são definidas pela razão entre um determinada propriedade P pela densidade ρ do material, ou seja:

O Gráfico 4 então apresenta a resistência à tração específica dos materiais analisados, mostrando que os materiais isotópicos são muito menos resistentes por unidade de massa do que as fibras de reforço. A madeira apresenta comportamento equivalente aos materiais metálicos nesse contexto.

Gráfico 4. Resistência à tração específica de materiais de engenharia

Por fim, o Gráfico 5 apresenta a mesma comparação em relação aos módulos de elasticidade específicos, destacando que as fibras de carbono são muito mais rígidas por unidade de peso do que os materiais metálicos.

Gráfico 5. Módulo de elasticidade específico de materiais de engenharia

Essas são as razões pelas quais os materiais compostos em geral são muito mais eficientes estruturalmente do que os materiais metálicos. Eles são capazes de realizar as tarefas desejadas, que são resistir a grandes níveis de tensão com deformações dentro dos limites determinados pelos projetistas, com o menor gasto de recursos possível. Neste caso, significa menor peso.  

No contexto de uma embarcação, seja a vela ou a motor, isso significa que é necessária uma potência menor para levar o barco adiante na velocidade desejada, ou que o navegador pode levar mais carga.

Aumento de Rigidez em Painéis Sandwich

Nas últimas semanas, um post do blog definiu os conceitos de rigidez e resistência utilizando um diagrama de tensão e deformação obtido a partir de um ensaio de tração. É muito frequente também dizer que o uso de materiais de núcleo aumentam a rigidez de painéis laminados.

A rigidez que tem um aumento significativo quando se utiliza materiais de núcleo é a rigidez à flexão. A flexão é causada quando um painel apoiado em suas laterais recebe uma carga normal a sua superfície, fazendo com que se deforme de uma maneira que uma das faces esteja submetida à tração, a face oposta à compressão e que a parte central esteja submetida a uma carga de cisalhamento. Esse tipo de carregamento é muito comum no fundo de embarcações como lanchas, por exemplo, que são frequentemente submetidos à pressão hidrodinâmica.

A rigidez, ou a resistência de uma viga à deformação por esse esforço, pode ser calculada como o produto do módulo de elasticidade do material que compõe a estrutura com o segundo momento de inércia da seção transversal, ou seja:

Enquanto o módulo de elasticidade é uma propriedade do material, o momento de inércia da seção transversal é uma característica que varia em função da geometria da estrutura. Como um exemplo, é possível considerar o painel de laminado sólido apresentado na Figura 1.

Figura 1. Painel de laminado sólido com rigidez D1

Nesse caso, é possível calcular a rigidez D1 do painel sólido com as dimensões indicadas na figura por meio da equação:

Onde Ef representa o módulo de elasticidade do composto, enquanto b é a largura do painel e H é a espessura. É possível observar que a rigidez à flexão é função do cubo da variável H do painel, o que significa que aumentar a espessura aumenta significativamente essa propriedade.

Aumentar a espessura de laminados sólidos é uma tarefa complicada que pode ser realizada aumentando o teor de resina ou aumentando o número de camadas de fibra. Como visto no post sobre micromecânica, aumentar o teor de resina prejudica muito as propriedades mecânicas do laminado, além de criar maior possibilidade de formação de vazios e aumentar o peso da estrutura. Por sua vez, aumentar o número de camadas de fibra torna o laminado mais caro, mais pesado e superdimensionado para tração sem de fato ter um aumento significativo de espessura.

A melhor solução para esse problema é aumentar a espessura do painel utilizando núcleos de baixa densidade. Para comparação, enquanto um laminado de sólido de fibra de vidro tem 1870 kg/m³, os núcleos de PVC possuem de 40 a 320 kg/m³ sendo que a maior parte das espumas utilizadas para construção náutica variam entre 60 kg/m³ e 130 kg/m.

Podemos utilizar a lógica das equações anteriores para estimar quanto que a inserção de um material de núcleo aumenta a rigidez de um painel sandwich como o ilustrado na Figura 2.

Figura 2. Painel sandwich com rigidez D

A rigidez D desse painel pode ser calculada a partir da soma das rigidezes das diferentes partes medidas a partir do eixo central da seção transversal, ou seja:

Onde Ec é o módulo de elasticidade do material de núcleo. O primeiro termo da equação diz respeito à rigidez das faces em relação aos seus próprios eixos centrais e pode ser desprezado quando a seguinte condição for satisfeita:

Já o segundo termo computa a transposição do cálculo do segundo momento de inércia das faces para o eixo central do núcleo sandwich. O terceiro termo é o cálculo da rigidez do núcleo em relação ao seu próprio eixo central e pode ser desprezado quando a seguinte expressão for verdade:

Dessa forma, o cálculo da rigidez de um painel sandwich pode ser realizado a partir da equação:

Que finalmente permite a avaliação do quanto o aumento da espessura pela inserção de um material de núcleo influencia a rigidez do painel. A Figura 3   mostra um painel cujas faces são compostas por metade da espessura do painel sólido da Figura 1, com um núcleo de espessura c = H.

Figura 3. Painel Sandwich com rigidez D2

A espessura da faces desse painel é de t = H/2 e a distância entre as linhas de centro das faces é de d = 3H/2. Dessa forma, a rigidez do painel pode ser calculada como:

A Figura 4 mostra um painel sandwich cuja espessura é duas vezes maior que a do painel da figura anterior, então, c = 3H. A espessura das faces permanece t = H/2 e, por isso, a distância entre as faces é d = 7H/2.

Figura 4. Painel sandwich com rigidez D3

A rigidez desse painel pode ser calculada como:

Ou seja, multiplicando a espessura de um painel em duas vezes pela inserção de um material de núcleo, a rigidez aumenta 6,75 vezes. Quando a espessura quadruplica, a rigidez aumenta 36,75 vezes. O aumento de espessura não representa um aumento muito significativo de peso, o que torna a estrutura muito mais eficiente.

A História da Fibra de Vidro

Depois de falar sobre a invenção do V Bottom e sobre os atores que colaboraram para a formulação da resina poliéster, o blog volta a discutir um pouco de história para contar sobre a invenção da fibra de vidro.

Apesar de fenícios, egípcios e até os gregos utilizarem uma versão rudimentar da fibra de vidro para confecção de artefatos de decoração desde a Antiguidade, a história da fibra de vidro utilizada no reforço de materiais compostos como se conhece hoje está muito ligada à história da empresa Owens Corning.

O primeiro passo em direção à fibra de reforço orginal ocorreu quando a empresa de Michael Owens, chamada Owens-Illinois, estava investindo em pesquisa para encontrar aplicações e maneiras de produzir fibra de vidro durante a Grande Depressão nos Estados Unidos. Nesse ambiente que buscava fomentar inovção, o engenheiro Games Slayter estava procurando maneiras de fundir uma logomarca colorida em uma garrafa de vidro. Quando pulverizou o vidro em uma chama, obteve um inesperado amontoados de fibra semelhantes a algodão, a primeira versão de fibra de vidro.

Esse emaranhado de fibras curtas e rudimentares era muito mais eficiente que o algodão para ser utilizado como filtros e ainda era barato o suficiente para ser substituído quando entupia, além de se mostrar um excelente isolante térmico. Com a popularização dos condicionadores de ar, os filtros da Owens-Illinois apresentaram recorde de vendas por décadas, representando a primeira forma comercial bem-sucedida de um produto feito a partir de fibra de vidro.

O desenvolvimento dos plásticos formulava o conceito de composites que se tem hoje. Há tempos se buscava a possibilidade de moldar geometrias complexas e grandes peças de uma só vez e os plásticos possibilitavam isso, mas pecavam em resistência e rigidez. Já se conhecia a necessidade de um material que reforçasse os novos polímeros que estavam sendo criados, seguindo a mesma lógica do concreto armado que utilizava barras de aço para reforçar as matrizes cimentícias.

A fibra de vidro já apresentava um potencial para essa aplicação, mas era limitada pelo seu formato de um emaranhado de fibras curtas e grossas. Já se tinha conhecimento que o reforço ideal para os plásticos deveria ter filamentos longos e individuais e o responsável por alcançar uma maneira de fabricar esse material foi Dale Kleist, estudante de mestrado da Universidade Estadual de Ohio que trabalhava meio-período na Owens-Illinois.

Kleist buscava uma maneira de selar duas metades de um bloco de vidro para formar uma peça que teria aplicações em trabalhos de arquitetura quando decidiu carregar uma pistola e pulverização de metal com vidro derretido no lugar do bronze normalmente utilizado. O resultado foi a obtenção de uma chuva de fibra de vidro ultrafina e filiforme que chamou a atenção de seus supervisores que rapidamente reconheceram o procedimento como uma excelente maneira de fabricar lã mineral para isolamento. Reconheceram também que o procedimento poderia facilmente ser adaptado para outras aplicações e em 1936, a Owens-Illinois patenteou a “Fiberglass”, mãe dos reforços de fibra de vidro que se conhece hoje.

 Um grande esforço de pesquisa foi então empregado para encontrar tratamentos térmicos que fornecessem flexibilidade suficiente às fibras para que fosse possível tramar um tecido adequado para que fosse possível utilizar o material como reforço em laminado de plástico.

Em 1938, quando a Owens-Illinois se fundiu com a Corning Glass e criou a Owens Corning, houve um investimento de milhões de dólares para encontrar maneiras de manufaturar os reforços de fibra de vidro em volume suficiente para aplicações industriais. Com isso, criou-se a maior fabricante mundial de reforços de fibra de vidro que até hoje é uma gigante no mercado, que criou primeira fibra de reforço.  

Fadiga em Materiais Compostos – Parte 2

O post da última semana definiu o conceito de resistência à fadiga em materiais compostos e indicou algumas das variáveis ambientais que influenciam o fenômeno, além de explicar a dinâmica de propagação de defeitos ao longo do aumento de número de ciclos. A ideia agora é apresentar quais tipos de materiais são mais ou suscetíveis às falhas por fadiga e quais os motivos por trás disso.

É possível começar falando das resinas, já que a delaminação é uma das falha que se propaga ao longo da vida de uma estrutura submetida a ciclos de tensão. A delaminação está muito ligada com a falha da adesão entre a fibra e a matriz polimérica, portanto é de se esperar que resinas com maior capacidade de adesão sejam mais resistentes. O Gráfico 1 aponta exatamente isso, com a resina epoxy superando a resina poliéster por quase toda a extensão do eixo que indica o número de ciclos até a falha.

Gráfico 1. Diagrama S x Nf para diferentes resinas

Outra questão a se observar é que, quanto mais a resistência do material depende das propriedades da matriz, pior será seu comportamento em fadiga. É por essa razão que laminados com fibras curtas apresentam menor resistência, já que absorvem uma quantidade de resina maior durante a laminação, como indicado no Gráfico 2.

Gráfico 2. Diagrama Tensão x Ciclos para fibras longas e curtas

Outra questão que piora o comportamento em fadiga de laminados de fibras curtas é que, pela natureza dos métodos de fabricação utilizados, é muito comum que eles apresentem um maior teor de vazios. Os vazios no laminado são causados por conta de ar aprisionado ou gases produzidos durante a cura da resina. Laminados fabricados sem o uso de gradientes de pressão apresentam uma quantidade maior desses espaços, que agem como concentradores de tensões e podem iniciar trincas. Por essa lógica, laminados estruturais produzidos por infusão ou prepregs apresentam performance melhores do que os produzidos por laminação manual, por spray-up ou laminação manual.

A configuração do reforço também influência a resistência à fadiga do laminado. O Gráfico 3 mostra três amostras da mesma gramatura ensaiadas, uma unidirecional, um cros-ply biaxial com filamentos orientados na direção 0° e 90° e um tecido bidirecional.

Gráfico 3. Diagrama S x Nf para diferentes reforços

Como maior parte dos filamentos do tecido unidirecional estão orientados para uma direção, sua performance em fadiga é melhor do que de um tecido cross-ply que divide as fibras em duas direções. O tecido bidirecional ainda tem sua performance prejudicada pela pré-tensão criada pela trama do tecido que ainda aumenta o teor de resina e facilita o aparecimento de vazios (microbolhas).

É importante destacar também que os materiais compostos apresentam comportamentos em fadiga diferentes se estão sendo submetidos à ciclos com esforços de tração ou compressão. Em geral, a resistência é bem maior em tração, tanto em laminados sólidos como naqueles reforçados com núcleos de espuma.